Técnica usada em condomínios privados em Goiás pode ser adotada pelo poder público para redução de impactos negativos das chuvas na cidade
Em 2023, o Brasil registrou o maior número da história de eventos climáticos ligados a desastres naturais. De acordo com o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), órgão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), no ano passado foram mapeadas 1.161 ocorrências climáticas que resultaram em deslizamentos, inundações e secas. Desse total de registros, 61% estavam associados a eventos hidrológicos, como transbordamento de rios e enchentes.
Além da notória ação predatória do ser humano sobre o meio ambiente, junta-se ao conjunto de causas desses desastres, que afetam principalmente as populações mais carentes nos grandes centros urbanos, a inoperância do poder público em lançar mão de soluções eficientes e ao mesmo tempo urgentes, para questões como drenagem urbana e permeabilidade do solo. Mas em grandes empreendimentos privados, algumas iniciativas adotadas possibilitam um manejo das águas pluviais muito mais eficiente, sustentável e a um custo baixo.
Uma dessas soluções é o uso dos swales ou valas de infiltração, técnica que consiste basicamente na escavação de valas que acompanham o desenho topográfico do terreno, promovendo a retenção e infiltração no solo da água da chuva de maneira mais eficiente, reduzindo significativamente impactos de fortes eventos climáticos e abastecendo, da forma mais natural possível, o lençol freático.
O swales foi desenvolvido pelo australiano Bill Molison, em 1981, e desde então vem sendo utilizado e aperfeiçoado em diversas partes do mundo. No Brasil, por exemplo, a técnica é bastante conhecida e tem feito parte de vários modelos imobiliários sustentáveis.
De acordo com a arquiteta e urbanista Luci Costa, o swale é um recurso viável para ser utilizado nas cidades. “Dependendo da topografia do terreno, as valas podem ser construídas em praças, canteiros centrais de avenidas, às margens de rodovias e até mesmo em espaços pequenos, como nos quintais das casas das pessoas, em condomínios horizontais ou nos loteamentos tradicionais”, comenta.
Em Goiânia, em alguns pontos da cidade, a técnica já é usada, como por exemplo no Parque Flamboyant, um dos principais parques da capital goiana, localizado no Jardim Goiás.
Sustentabilidade
Em Terezópolis de Goiás, a técnica vem sendo adotada, uma vez que o município está totalmente dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) do João Leite, onde está a maior reserva hídrica da região metropolitana de Goiânia. Para evitar que a água não tratada escorra para o reservatório, a técnica de swales vem sendo uma alternativa utilizada. Desta forma, a chuva infiltra no solo, que se encarrega de filtrar impurezas.
O mais recente projeto utilizando o swales é o condomínio horizontal Aldeia Santerê Casa e Natureza. O empreendimento fica no perímetro urbano de Terezópolis de Goiás, a 18 km de Goiânia e a 17 km de Anápolis, às margens da BR-060 e terá área de swales equivalente a 110 mil metros.
Junto aos swales, que estarão na divisa entre os lotes, o projeto inclui também a criação de um pomar com largura de 15 metros, formando verdadeiras “artérias verdes”. A ideia é plantar espécies nativas que vão ajudar na conservação e na manutenção da biodiversidade e da fauna nativa do local e, ao mesmo tempo, farão uma divisa natural entre as moradias com frutas para toda a vizinhança.
“É possível construir de maneira consciente, mantendo a preservação dos recursos naturais e o conforto e segurança dos moradores”, diz a arquiteta Andrea Accioly, uma das responsáveis pelo projeto de urbanismo do Santerê.
De acordo com o biólogo e agroflorestador Murilo Arantes, entre os benefícios do sistema de swales está o uso do solo de forma orgânica, tal qual como ocorre na natureza, facilitando o ciclo natural da água. “Diferente dos sistemas de drenagem convencionais, que apenas direcionam o fluxo da água para outro local, muitas vezes fora da área, gerando impactos, com o swales você pega a água que está chegando no seu terreno e promove a infiltração ali mesmo”, explica.